sexta-feira, 7 de abril de 2017

ANÁLISE CRÍTICA DO ESPETÁCULO “(IN) CONSCIÊNCIA”



ANÁLISE CRÍTICA DO ESPETÁCULO “(IN) CONSCIÊNCIA”



Muitos já ouviram a palavra merda. No contexto teatral ela significa “boa sorte” e na vida cotidiana algo que sai errado. Tão poucas vezes escutei essa palavra ser pronunciada, principalmente em um texto teatral. Não sou contra o uso de palavrões ou de palavras menos “usuais”, no que se diz respeito a se entender “vocabulário chulo”, mas pode e deve haver uma preocupação com alternâncias de palavras para não se tornar repetitivo e nem demonstrar falta de preocupação com o significado do que quer dizer. O texto me pareceu um tanto quanto improvisado, sem muita profundidade ou preocupação com a trama em seus diálogos. O cenário ficou muito bem definido com a sua proposta de se fazer identificável para a plateia da ambientação do espetáculo e a sua função. Mas creio que muitos elementos que compunham o cenário estavam ali meramente para o enfeite, sem nenhum propósito ou utilização de importância para as ações. Usamos muito no meio teatral a questão do funcionamento de tudo que está em cena, por questões de utilidade objetiva e claro, por questões financeiras. Algo deve existir por que tem a importância para a ação e não simplesmente para ornamentar. Nos tempos atuais a economia pode ser essencial e a funcionalidade primordial. Digamos que o cenário foi mais que a trama. A luz sempre é imaginada para dar um toque especial a cena, caracterizar o momento, desde que seja bem pensada e aplicada e no espetáculo essa utilização foi bem atribuída e com certeza bem pensada e ideal para cada acontecimento. Os figurinos, sem grandes preocupações ou necessidades especiais para a proposta estavam bem encaixados. Não é necessário ter figurinos muito produzidos e caros para se ter o efeito necessário daquilo que pede a peça e o seu personagem. Para mim a questão figurinista foi bem aplicada, sem exageros. As oficinas preparatórias, na minha visão, são extremamente importantes para a concepção do espetáculo, conhecimento do elenco, preparação do ator e principalmente para o desenvolvimento e autoconhecimento de cada um para estar preparado e confiante na encenação. Creio que nesse processo pode ter acontecido falhas, pois nitidamente havia muitos atores que estavam em cena sem muita experimentação, sem muita vivência de si, consciência das circunstâncias e do outro. A criação da personagem, a aceitação, o seu entendimento e o seu desenvolvimento não se transcorreu durante todo o espetáculo. Não houve preocupação em viver aquele ser e crer em suas circunstancias dadas. Não estou dizendo em relação a voz e corpo, que podem ser importantes na composição, mas sim em crer na verdade do personagem, viver o papel. Além de dizer coisas que Stanislavski dizia, e que muitos pensadores, diretores, professores e orientadores teatrais pregam para uma boa atuação, digo sobre o cuidado com a forma e a criação. Mas repito, pode ser uma proposta de ter personagens menos estudados, com menos complexidade de subtexto (o que não está explicito - o que foi ou aconteceu antes do momento daquele estar na peça ou no depois o que pode acontecer), no corporal, emocional, psicológico, etc. Mas ficou claro que os próprios atores estavam vivendo aquilo e sem as emoções dos acontecimentos. Digamos que tem uma base do método de Meisner, mas sem a sua aplicação adequada. As técnicas teatrais existem e devem orientar os atores em seu processo de criação, entendimento, posicionamento e aplicação cênica, mas não devem aparecer durante a apresentação. Devem ser ferramentas para ajudar o ator a internalizar a verdade que buscam, e a cada um cabe buscar seu objetivo de estar em determinado local ou marcação, não somente porque é necessário estar ali, mas porque tem um objetivo que o faz estar lá. E no espetáculo muitos deixaram demonstrar a necessidade de estar em certo lugar para acontecer a cena, a ação e não o pôr que deveriam estar ali. Senti muitos olhares perdidos, ao contracenarem, ou cantarem, olhares para cima, para baixo, indicando em sua expressão facial e corporal a insegurança em alguns momentos. O fazer a graça por graça, só porque a plateia gostou de determinado ato ou fala e repetir constantemente só para continuar a fazer a graça a faz ser sem graça. Sai do propósito do efeito que se quer causar. A questão do espaço também chamou muito a atenção pela sua distribuição, onde muitos estavam encobertos por outros e não se propuseram a encontrar o lugar que os identificariam em melhor posição cênica. Muitos atores acusaram uma certa dose de desconhecimento dos acontecimentos cênicos, pois estavam perdidos na cena e na composição coreógrafa. Tendo suas tensões expostas fisicamente. Talvez daí também a preocupação clara da marcação. Tivemos em suas performances musicais a questão do som alto em seu início, não dando para escutar a letra e o ritmo e isso incomodava a quem assistia. Depois foi resolvido e assim ficou mais agradável a escuta. A articulação em alguns momentos ficou a desejar nas músicas, mas de modo geral as letras foram bem designadas. Não custa lembrar que o ator deve cuidar do corpo, voz e mente. Em uma dessas coreografias a que mais me chamou atenção foi a que teve a utilização de celulares para mostrar a palavra HELP, e com isso creio que ficou visualmente lindo. Voltando ao texto me sugeriu muito aos vocábulos de Plínio Marcos em espacial uma de suas obras “Dois perdidos numa noite suja” (boa indicação de obra e autor), assim como o ambiente/estilo Underground. Percebi também uma analogia ao filme “Jogos Mortais” na questão de estarem em um ambiente sem saber o pôr que e o que esperar, assim como a voz saindo do nada instigando entre eles os questionamentos e as decisões. Devo dizer que o excesso da voz, vindo de fora da cena/palco como articulador das “entregas” das personagens se tornou um tanto enjoativo pela repetição e que poderia ser menor e com mais objetividade. A ideia das colocações des palavras para um jogo de adivinhar e com isso os “personagens” começarem a desvendar a causa da expulsão de uma aluna com palavras como: maledicência, culpa e preconceito como o jogo da palavra fez a peça se tornar mais intrigante e ai sim vi acontecer a trama e a atenção do público realmente esteve ali. A solução encontrada como sendo a consciência impulsionada pela inconsciência de Diego, que fez com que os outros descobrissem e aceitassem suas culpas foi fantástico para o encerramento porque assim a consciência de cada um que estava assistindo foi afetada e as informações mandadas ao inconsciente sobre o que fazemos com nossas invejas, nossas vaidades e nossas palavras proferidas de maneiras bobas as vezes. Como se fosse um telefone sem fio (outra brincadeira) a informação sem o seu devido cuidado do transmissor e do seu receptor pode ser deturpada, e alcançar patamares que o preconceito já está acontecendo mesmo sem cada um querer e a pressão pode nos tornar cada vez mais frágeis e os nossos sentimentos e necessidades de sermos melhores que outros nos tornar vulgares e irracionais.

Para finalizar, não sei se houve problemas durante o processo, como cada um lidou com cada questão, qual foi a proposta exata, mas nessa análise busquei esmiuçar aspectos que me parecem importantes e que não busco ofender ou “meter o pau” no trabalho, mas sim ajudar na construção e na execução. Os profissionais que estavam envolvidos gozam de um prestígio imenso por serem capacitados e as questões aqui levantadas não se referem ao um todo dos mesmos. Lembrando que esse espetáculo estará em cartaz ainda na cidade de São Carlos.



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