segunda-feira, 10 de junho de 2013

Análise crítica do espetáculo “Ao Revés do Papel” - Grupo de Teatro Preto no Branco

Análise crítica do espetáculo “Ao Revés do Papel” - Grupo de Teatro Preto no Branco - Apresentação no Mapa Cultural de São Carlos de 2013


O espetáculo nos apresenta logo de cara um aspecto diferente do palco, quando aos nossos olhos é lançada a figura de um quadrado feito por um material picado que chama à atenção por ser uma forma de limitar as dimensões da atuação. Uma estética muito bonita. Os figurinos com a proposta estão muito bem resolvidos a princípio. A entrada das personagens instiga o público a ter um olhar mais analítico da composição. A cena que inicia a peça nos mostra personagens com ações corporais animalescas, com uma linguagem própria e uma outra linguagem utilizada na contação das histórias. O trabalho dos atores se evidencia na construção corporal, mas ainda remete ao abuso dos movimentos. Não digo que cada um seja um personagem-tipo, mas a repetição dos movimentos agrada em um momento de reconhecimento da personagem e com o tempo alguns outros movimentos acabam sendo deixados de lado pelo público devido ao esgotamento do novo. Na construção das personagens consideradas principais, a que mais se destaca é a da atriz Ana Garbuio, onde a caracterização transmite uma sensação de prazer ao  vê-la repetidas vezes se utilizando dos mesmos artifícios, porém de uma forma leve e gostosa de se ver. Fato esse que não ocorreu na interpretação da prostituta. Ao se deparar com a personagem da prostituta a atriz Ana Garbuio demostrou um afastamento muito grande da atuação requisitada. Demostrou não estar “á vontade” com o papel. Nos apresenta uma certa imaturidade, mas uma imaturidade não pelo fato da atriz não ser capaz da atuação, mas sim de uma apropriação que ainda não está preparada no ponto de exercer um papel mais sexual, talvez pela pouca idade e pouca experiência. A atriz Ana Garbuio demonstra uma excelente qualidade de interatividade com os demais e uma leveza nas personagens mais caracterizadas pela doçura. A atriz Nádia Stevanato em sua personagem não conseguiu realçar aos olhos a construção mais acabada, mas a sua força enquanto segurar as cenas mais sexuais trouxe a energia necessária para a intenção buscada pelo texto. Força essa que levaria à personagem da prostituta um caráter mais impactante, devido aos traços mais maduros e a sua desenvoltura que me pareceu mais eficaz para aquele papel. O ator Bruno Garbuio catalisa a modificação do corpo e da atuação de uma maneira mais abrangente, com um repertório maior de soluções em cena. A personagem principal que se dá através do “andarilho” de certa forma é bem construído, porém com certas semelhanças com outras composições. Mas isso não ofuscou a desenvoltura das transformações do ator, que demonstrou ser excelente na segurança da interpretação. Porém essa personagem exagera no uso de um palavrão repetido algumas vezes. Utilização essa que ao ouvir pela primeira vez, parece engraçado, na segunda, engraçadinho, já na terceira perde o propósito. Podemos dizer que é o “querer fazer graça”. A maior qualidade do ator foi demostrada na performance da composição dos personagens “secundários” como utilizados na cena em que há um enfrentamento, e a troca feita pelo mesmo ator foi cativante e bem elaborada. A solução criativa e bem ousada dessa cena é digna de muitos elogios. Outra cena bem construída foi a da relação sexual das personagens. Por mais que a composição já tenha sido vista em encenações de dança, a resolução e a sutileza que os atores realizaram na cena foram de pura sensibilidade e o de sentir e passar o momento. Considero que a iluminação teve pontos negativos, principalmente no que se refere ao “desaparecimento” das faces dos atores em um ou dois momentos que julgo ser de observação das emoções. Voltando a cena da prostituta e do sonho de se casar, a representação se passa de maneira muito longa e de pouca produtividade para o espetáculo. Faltou ser um pouco mais coreografada nos movimentos e mais curta. A intencionalidade de realizar a troca aos olhos da plateia é de muito bom gosto e mostra a despreocupação que o grupo tem em estar sempre sendo observado pelo público.
A direção realizada pelo Fernando Cruz mostra a sua cara na criatividade das soluções cênicas, na ocupação bem distribuída do espaço e da quebra da personagem com o ator (distanciamento). Esse mecanismo é referente à ideia, mas também podemos dizer uma sugestão que o dramaturgo e encenador alemão Berthold Brecht procurava dissipar em seus trabalhos. Mostra que a direção está atenta e sabedora de muitas maneiras de se realizar um trabalho. Não posso deixar de dizer que a direção também mostra uma irrelevância na preparação do acabamento dos atores, na instigação dos sentimentos e no dinamismo de algumas ações estéticas. Considero que o texto pode ser enriquecido e valorizar mais as personagens consideradas principais.
Embora tenha sido uma pequena mostra do espetáculo, fato que poderemos apreciar na íntegra no FESTA a partir de julho, essas são observações e uma análise que nunca serão destrutivas, mas sempre com o intuito de poder ajudar.

Um comentário:

  1. Até que em fim um blog para discutir, analisar e aprender sobre cultura em geral.

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